sexta-feira, 8 de março de 2013

Seca e Poesia

No Nordeste, o choro e o lamento em face da seca que se abate sobre os sertões, manifestam-se com força de denúncia no canto de seus poetas populares. A literatura de cordel é prolífica na abordagem desse tema tão recorrente quanto o fenômeno que atenaza a vida dos sertanejos.
Famosa é a poesia de autoria de Patativa do Assaré, a “Triste Partida”, que conta a saga de uma família nordestina em êxodo para o sul do País. O dolorido poema, escrito nos idos de 1950, continua vivo no cotidiano dos nordestinos,  que apesar dos avanços sociais continuam a migrar para centros urbanós, abandonando o campo onde a seca continua a matar bichos e homens. Neste ano, por exemplo, os Estados nordestinos estão sob as agruras da maior estiagem dos últimos 40 anos.
Nos ouvidos do sertanejo crédulo e paciente ressoa a voz do poeta, que lhe dá mais um pouco de esperança: “Sem chuva na terra descamba janeiro,/ depois fevereiro e o mesmo verão,/ Entonce o nortista, pensando consigo/ Diz: “isso é castigo, não chove mais não./// Apela pra março que é o mês preferido do santo querido Sinhô São José/ Mas nada de chuva, tá tudo sem jeito/ Lhe foge do peito o resto da fé”.
Outros poetas não deixaram por menos e passaram às páginas de folhetos de cordel o sentimento de angústia, revolta e impotência que lhes vai na alma. Rafael Vasconcelos, por exemplo, cantou: “Todo sertanejo chora/ Quando há seca no sertão/ Racha o solo, chupa a água,/ No cercado só vê chão,/ Quer saber se é culpado/ Julgando que é pecado/ E a Deus pede perdão(...) A pior coisa do mundo/ É plantar na sequidão/ Ver o solo ressecado/ Sem cair água no chão/ Passam fome as crianças,/ Todos perdem as esperanças/ De colher sequer um grão.
De igual modo Sá de João Pessoa, poeta paraibano, expressa sua revolta com os desajustes políticos e sociais, que fazem assomar as injustiças causadas pelos detentores do poder aos sertanejos pobres, habitantes dos confins do semiárido nordestino, os quais, desprezados pelos governantes parecem abandonados pelo próprio Deus. Ei-lo versificando: “Desde a criação do mundo/ Que se vê o sofrimento/ Da gente do meu sertão/ Que eu choro o padecimento,/ Dá uma tristeza se ouvir/ Tanto sofrer e lamento”.
Qualquer semelhança dos versos escritos pelos nossos tão inspirados quanto justamente revoltados poetas, com a situação do Nordeste nos dias dias hodiernos, não será mera coincidência.
Texto do escritor Barros Alves, publicado no Jornal O Estado Ce. Foto do site terranovaonline.net 

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