Esse artigo foi publicado no site Meio e Mensagem em fevereiro deste ano. Dado à importância de seu conteúdo para os meios de comunicações, especialmente, para o meio jornalístico, achei interessante reproduzi-lo.
Marcos Filho
Marcos Filho
Peter Oborne
Crédito: Christ's College Cambridge/Divulgação |
Atire a primeira pedra o acionista de um veículo de
comunicações – ou diretor-executivo – que nunca interferiu na linha editorial
para proteger algum anunciante. Quem se posicionar na primeira linha dos
atiradores de pedras estará seguramente mentindo. Meios de comunicação têm
poder, encontram eco na audiência. E assustam anunciantes.
Não confunda com linha editorial – sempre legítima,
abertamente apoiada pelo Conselho ou pelos acionistas. A TV pode ser pró isso
ou contra aquilo sem problemas, basta deixar o posicionamento claro para a
audiência. Jornais podem defender este ou aquele valor, também sem tentar
esconder dos leitores.
O que não se pode na regra do bom jornalismo é mentir. O
carnaval em Londres foi abalado pelas declarações do ex-colunista político
Peter Oborne, que deixou o The Daily Telegraph em janeiro. Oborne alega ter
pedido as contas por interferência direta da direção do jornal britânico para
proteger o HSBC. A direção orientou a redação a “pegar leve” nas reportagens
sobre o banco, apesar das denúncias de contas secretas na Suíça e na Ilha de
Jersey – notícia em toda a mídia internacional. O HBSC, vale dizer, é um dos
maiores anunciantes do Telegraph.
Peter Oborne diz que escutou de um alto executivo do jornal:
“O HSBC é um anunciante que não pode se ofender”. O banco suspendeu os anúncios
no jornal quando as investigações começaram – e permaneceu fora da mídia por 12
meses. Voltou às páginas há pouco. Com um volume de dinheiro nada desprezível.
Oborne, sim, se ofendeu. A história que ele tinha em mãos
acabou no concorrente The Guardian. É um tremendo escândalo. “O The Daily
Telegraph cometeu fraude para com os seus leitores”, acusa Oborne no site
OpenDemocracy, que publicou o desabafo.
Não é só na Inglaterra que a mentira e a omissão,
justificada pelo equilíbrio das contas, existem na mídia. A esmagadora maioria
dos meios de comunicação do Brasil estão comprometidos com anunciantes. No
interior a relação promíscua acontece quase sempre com as prefeituras. Nas
grandes cidades com os anunciantes donos de contas gordas que ajudam a pagar os
salários.
A lógica dos meios de comunicação se inverteu. O correto
seria: Independência gera audiência. Audiência gera anúncios. Anúncios geram
dinheiro. Dinheiro sustenta a independência.
O medo e a mediocridade inverteu a lógica que passou a ser:
Anúncios pagam salários de jornalistas. Jornalistas devem entender que há temas
proibidos. Temas proibidos fora da mídia alegram anunciantes. Anunciantes
programam mais anúncios.
Uma das grandes mudanças com o avanço da tecnologia e o
crescimento das redes sociais é a democratização do espaço digital. Isso está
fazendo com que mais Peter Obornes saiam dos armários.
O bom jornalismo agradece.
Eduardo Tessler, 50 anos, gaúcho, é diretor para o Brasil da
Innovation Media Consulting Group. Foi repórter, correspondente internacional,
editor e diretor de redação de diversos veículos brasileiros, e edita hoje site
de crítica de informação Mídia Mundo.
Fonte: www.meioemensagem.com.br
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